Apr 13, 2009

Os chineses e o Kung Fu - 中国人和功夫

[foto tirada à caminho do templo de Shaolin, perto da cidade de Zhengzhou (província de Henan) onde estive em Outubro de 2008]

Quem nunca ouviu falar em "kung fu"? Este termo de sonoridade cantonense (em mandarim diz-se "Gong Fu", 功夫) designa para nós, ocidentais, as artes marciais chinesas em geral.
Na verdade é uma atribuição errada pois o nome que denomina tal generalidade é "wuchu" (武术).

"Gong fu" (ou "kung fu") quer dizer na verdade, o domínio de uma arte, sendo que "gong" significa "perfeição", "controlo", "domínio" em português e "fu" significa "arte", "ofício". Assim sendo, se dominarmos completamente uma qualquer arte somos "gong fu".
Daí se designar na China aqueles que dominam a arte de servir chá de "gongfu cha" (功夫茶).

O "wushu" (as artes marciais em geral) faz parte do currículo universitário sendo uma das disciplinas integrates das aulas de ginástica: "Qigong" (氣功) e "Taiji quan" (太极拳), são por exemplo, algumas das artes marciais ensinadas aos alunos.

Em termos de cinema, virou moda associar o "kung fu" (enquanto "arte marcial específica") a uma variedade de aspectos da vida quotidiana ou desportos.
Desde aos filmes interessantes e de qualidade do actor e realizador Stephen Chow (周星驰) aos medíocres filmes de 2ª classe (para não dizer pior).

De e com Stephen Chow (Zhou xingchi), actor aliás que prezo, temos os conhecidíssimos "Shaolin Soccer" (少林足球) - basicamente futebol associado ao "kung fu";
E "Kung Fu Hustle" (功夫) que em português creio que foi traduzido por “Kungfusão” - luta entre a máfia e uns pobres aldeões.
De realçar que estes dois filmes são de Hong Kong, território onde, para mim se produzem filmes de qualidade superior àqueles que se fazem no continente chinês. Atenção, falo aqui de filmes comerciais, pois em termos de cinema "alternativo" a China continental tem muito bons filmes.

Mas pelo amor de Deus, há limites!
Os dois seguintes são de uma mediocridade ímpare, especialmente o 2º!
O 1º realizado em conjunto entre Taiwan e a China continental e o segundo produzido na China:
Kung Fu Dunk (功夫灌篮) - basicamente basquetebol e "kung fu" (para mim uma tentativa falhada do "Shaolin Soccer");
e o 2º intitulado (de fugir!), Kung fu hip hop (精舞门) do realizador Fu Huayang, onde se tenta articular a música e dança hip hop ao "kung fu"!
De facto, a inspiração (ou ousadia) humana não tem limites e prova disso são estes dois filmes (entre tantos outros). Mas aqui, insiste-se em associar as artes marciais chinesas com aspectos do nosso quotidiano ou sociedade que nalgumas ocasiões não têm relação nenhuma, revelando apenas a necessidade que alguns chineses têm em querer fazer crer que em qualquer e toda actividade humana há algo de profundamente chinês... Por exemplo no filme "kung fu hip hop" há uma personagem que tem o descaramento de dizer que o hip hop (parto do princípio que o homem se refere apenas à dança) vem do "kung fu"... ah pois é...!

Em termos cinematográficos o que é que falta? Bem, pensei em "Kung fu badmínton"! Ou "Kung fu ping pong"? E porque não, sendo estas modalidades desportivas as preferidas dos chineses?

Bom, em termos de terminologia, se considerarmos o real significado do termo "kung fu" (dominar totalmente uma arte), todos estes filmes estariam a usa-lo de forma correcta mas na verdade, todos eles põem de lado este facto e utilizam aqui a designação como se ela significasse uma arte marcial específica...

Divagações, divagações...

Apr 12, 2009

Saudades... - 思念...


... que eu tenho de uma Super Bock bem fresquinha...

Apr 11, 2009

A festa do Qingming (Suprema Claridade) – 清明节

O último fim de semana foi um final de semana prolongado visto que na 2ª feira foi feriado! E isso dá-se pelo facto de celebrarmos na China o Qingming.

Contrariamente à grande parte das celebrações tradicionais chinesas ligadas ao calendário lunar, a Festa do Qingming está ligada ao calendário solar.
Esta celebração está associada às mudanças climatéricas e ao ciclo agrícola. É celebrada no terceiro mês lunar (Abril), época relacionada com a crença de que a vida se renova nos primeiros dias desse mês. Esta ocasião está assim associada à ideia de “rejuvenescimento das forças da natureza”, à pureza e ao renascimento.

Mas esta celebração de tradição agrícola também tem um carácter de cunho familiar, tais como as de homenagem aos familiares falecidos. O Qingming é desta forma e sobretudo uma festa dedicada aos antepassados, pilar e eixo da moral confucionista.

Durante os dias da festividade costuma-se ir aos cemitérios ou aos túmulos “espalhados” nalguns montes, enfim, para todos os locais onde estão sepultados os antepassados para prestar-lhes homenagem e culto. Limapam-se as campas e os arredores; e faz-se um piquenique junto à campa, partilhando desta forma uma refeição com o defunto. Na verdade, apenas os mais velhos o farão. Quando hoje falei com a geração mais nova (na faixa dos 20 anos), todos eles responderam que não a celebravam e alguns inclusivé desconheciam as tradições dos seus avós.

(Nas fotos em cima: o mesmo túmulo num monte, antes e depois da festa do Qingming.)

Mas esta celebração não é somente uma ocasião de culto: é igualmente o sinal anunciador da primavera. E a primavera é a época de lançamento de papagaios, sobretudo no Norte da China, onde há muito vento.

O papagaio poderá ter sido inventado há mais de 2300 anos, durante o período dos Reinos Combatentes (475-221 a. C.), por um marceneiro de seu nome Lu Ban (鲁班).
No entanto, há quem diga que Lu Ban terá “apenas” melhorado o design do papagaio que lhe terá sido dado pelo seu mestre Mo Zi (墨子) também conhecido por Mo Di (墨翟), um filósofo, este sim, inventor do engenho.

A finalidade da sua utilização era muito diferente da de hoje. De facto, mais do que um divertimento, o papagaio era inicialmente utilizado para fins militares.
Ao que parece, o primeiro imperador da dinastia Liang (梁朝) (502-557), Wudi Liang (梁武帝) terá utilizado um papagaio aqui mesmo em Nanjing, como “SOS”, para pedir ajuda quando veio ocupar a cidade.

Mesmo que cada dinastia tenha utilizado o papagaio de diferentes maneiras (uns serviram-se do engenho para elevar homens aos céus e espiar ou vigiar tropas inimigas; outros utilizavam-no como meio de propagação de propaganda) o certo é que o fim a que este se destinava era unicamente militar.

Mais tarde, também se começou a lançar papagaios com o propósito de pedir protecção às divindades. Quanto mais alto subisse o papagaio mais facilmente os deuses receberiam as solicitações. Os mais supersticiosos acreditavam ainda que estes lançamentos transportavam para o céu, toda a má sorte de um homem, afastando desta forma, a má influência dos espíritos malignos. Por essa razão, diz-se, nunca se deve pegar num papagaio encontrado no chão ou preso numa árvore.

O lançamento de papagaios terá começado a ser usado como divertimento durante a dinastia Tang (唐, 618-907).
E aí sim, encontraremos miúdos e graúdes a deliciar-se com esta actividade. Aqui em Nanjing tenho visto muitos papagaios deverás interessantes, não tanto pela envergadura ou beleza, mas sim pelas representações adoptadas (o bat-sinal do Batman, por exemplo).

A propósito, em Macau também se lançavam papagaios (em qualquer altura do ano) numa brincadeira a que se chamava de “corta-corta”. O fio do papagaio era revestido de cola e cacos de vidro. Os miúdos faziam “lutas” de papagaios cujo objectivo era cortar o fio do papagaio do oponente. Brincadeira que desapareceu completamente.

Para mais informações sobre esta festividade e em particular celebrada em Macau, vejam o artigo publicado no meu blogue anterior “Existir em Macau”: http://existiremmacau.blogspot.com/2007/04/festa-do-chingming.html

Apr 10, 2009

Quando devemos deixar a China? - 什么时候我们得离开中国?

Algumas vezes passa-nos pela cabeça (a nós "expatriados") uma pergunta que coloca toda a nossa existência num determinado lugar, em causa: o que raio faço eu aqui?

Confesso que por várias vezes já me deparei com tal questão.
No blogue "Deserto de Gobi" (http://desertodegobi.blogspot.com/) foi publicado no dia 25 de Junho de 2007 uma interessante lista de razões pelas quais deveríamos deixar a China, intitulado "80 sintomas da doença".

Transcrevo (e traduzo) aqui apenas algumas, aquelas que considero mais engraçadas e próximas da realidade.

Está na hora de deixar a China quando...

1- ... adoramos KTV;
2- ... fumamos num elevador cheio de gente;
3- ... todos os estrangeiros nos parecem iguais;
4- ... já não precisamos de lenços para nos assoarmos;
5- ... achamos as casas de banho ocidentais, desconfortáveis;
6- ... achamos normal atirar o lixo pela janela do 18º andar, mesmo que seja o nosso velho frigorífico;
7- ... dizemos aos nossos pais, lá na terra, que a casa deles tem mau Feng Shui;
8- ... andamos sempre com um maço de notas de dinheiro no bolso;
9- ... não temos qualquer problema em cuspir para o chão dentro de um restaurante;
10- ... preferimos pagar 10 yuan para ficar num cibercafé toda à noite do que pagar 30 para voltar para casa;
11- ... já não fazemos fila, preferindo passar directamente à frente;
12- ... já se torna engraçado tentar entrar num elevador quando as pessoas ainda estão a sair dele;
13- ... já não nos surpreende que a única resolução tomada numa reunião é a hora e o local da próxima reunião;
14- ... acreditamos em tudo aquilo que é dito nos jornais;
15- ... um acidente rodoviário é caso para rir;
16- ... ao fazermos compras, encontramos um "laowai" e tentamos imediatamente olhar para o seu carrinho de mão para ver o que ele comprou e assim saber o que ele come;
17- ... temos a unha do nosso dedo mimdinho bem comprida;
18- ... achamos valer a pena fazer fila para comer no Pizza Hut;
19- ... quando, numa fila, passamos à frente, porque o estúpido do "laiwai" deixou 2 centímetros entre ele e a pessoa à sua frente;
20- ... não temos absoluta noção das regras de trânsito;
21- ... começamos a chamar os outros estrangeiros de "laowai";
22- ... da última vez que visitamos os nossos pais, deixamos-lhes o nosso cartão de visita;
23- ... achamos que nenhum carro é completo sem a caixinha do lenços de papel no tablier;
24- ... saimos a rua de pijama;
25- ... "poluição, que poluição? Onde?";
26- ... achamos que "comprimidos brancos, comprimidos azuis e comprimidos cor de rosa" é uma resposta adequada para a pergunta "o que é que me está a receitar sr. doutor?";
27- ... a queima de panchões já não nos incomoda;
28- ... a nossa família deixou de nos perguntar quando voltaremos para casa;
29- ... se torna giro comer de garfo e faca;
30- ... temos saudades de comida chinesa quando estamos na nossa terra;
31- ... para nós, uma salada é um prato de fruta cortada em pedaços com maionese;
32- ... vestimos um fato para trabalharmos no jardim ou fazer alguns reparos em casa;
33- ... não conseguimos dizer um número sem fazer o respectivo sinal com a mão;
34- ... reconhecemos todas as músicas chinesas que passam na rádio e cantámo-las em conjunto com o condutor de táxi;

Estão aqui apenas 35 dos 80 sintomas... hilariante!

Apr 3, 2009

Sugestão DVDs (II) - 推荐 DVD (二)

Mais duas sugestões vídeo:

BBC: Wild China (BBC: 美丽中国)
Óptimo documentário sobre a história natural da China, co-produzido pela BBC e a Televisão Central da China.
O filme é de uma extrema beleza (com a qualidade que só a BBC sabe produzir) e revela-nos uma China fascinante em termos de fauna e flora mas também em termos de formas tradicionais de vida de vários povos, sempre em estreita ligação com a natureza que os rodeia (ainda e por enquanto). Aspecto que torna o filme cultural.
Aborda também os perigos existentes devido aos problemas ambientais e desenvolvimento humano, alertando para o facto de existirem actualmente na China, na área da protecção ambiental, grandes lacunas e uma falta de profissionais qualificados.

Dividido em 6 partes:
1ª parte: Heart of the Dragon
2ª parte: Shangri-La
3ª parte: Tibet
4ª parte: Beyond the Great Wall
5ª parte: Land of the Panda
6ª parte: Tides of Change


Chung Kuo - Cina (中国)
Um documentário realizado em 1972 por Michelangelo Antonioni (narrado pelo próprio) em Beijing, Nanjing, Suzhou, Shanghai e na província de Henan.
Filmado unicamente nas áreas que era permitido visitar Antonioni foca-se essencialmente nas actividades quotidianas dos chineses.

Dividido em 3 partes:
1ª parte: Beijing e arredores.
2ª parte: Suzhou e província de Henan.
3ª parte: Shanghai e Nanjing.

Documentário proibido na China mas que podemos encontrar nalgumas lojas (cópias piratas).
Se perceberem chinês, não deixa de ser interessante tentarem ouvir o que dizem certos interlocutores face à câmera e perante os “oficiais” chineses que seguem a equipa de filmagem. É basicamente o “politicamente correcto”, mas são reacções muito interessantes.